segunda-feira, 18 de março de 2013

Só uma brincadeira

Estudantes de DIREITO da UFMG promovem trote racista, com referências jocosas à escravidão e ao nazismo.

Vejo pela internet muita gente se mostrando surpresa por se tratar de um curso de Direito; acredito que essa surpresa se deve a uma suposição, razoável, de que nos cursos de Direito e entre seus professores e alunos há maior observância a leis e aos direitos. Eu, porém, não me surpreendo.

Os cursos de Direito, no Brasil, têm sido um lugar privilegiado de reprodução de nossas elites, especialmente por meio de faculdades mais antigas e reputadas como a própria UFMG. E, ao produzirem novos membros dessa elite, as faculdades "tradicionais" reproduzem também suas ideologias e seus mecanismos mais sutis de dominação. Por isso é que, se das faculdades de Direito saíram muitos "heróis da liberdade" (de abolicionistas ao final do Império a militantes contrários à ditadura militar de 1964), delas saíram também as muitas mentes que sustentaram, nos planos jurídico e político, as nossas ditaduras do século XX e outras violações de direitos pelo Estado brasileiro (de Francisco Campos a Gama e Silva, entre outros).

Além disso, a institucionalização do discurso dos direitos humanos na ordem jurídica e no ensino do Direito não é suficiente para se criar e manter uma cultura de direitos humanos. No plano político, Edson Teles já mostrou, em ótimo texto recente, os riscos de que espaços institucionais voltados para a defesa dos direitos humanos sejam apropriados por discursos que negam o potencial crítico e de denúncia desses espaços e da própria concepção original dos direitos humanos - como é o caso da eleição de Marcos Feliciano como presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados.

No plano do ensino do Direito, essa institucionalização do discurso dos direitos humanos também pode se dar de forma apenas formal, superficial; e, assim, apenas formalmente aceito e replicável, o discurso dos direitos humanos pode ser também facilmente verificável ao final do semestre letivo em uma prova dissertativa (ou de múltipla escolha, que é o que a OAB tem feito em seu Exame de Ordem com questões de direitos humanos e filosofia). Não me espantarei se os autores do trote da UFMG já tenham sido aprovados, ou ainda venham a ser aprovados nos períodos subsequentes, sem muitos problemas, nas disciplinas de Ética, Teoria da Constituição e Direito Constitucional que fazem parte da grade curricular de seu curso.

E não me venham com a alegação de que "é só uma brincadeira". Não tem graça fazer brincadeira com quem só se ferra na vida e na história. Não tem graça fazer brincadeira com o sofrimento de um povo, de gerações dizimadas pelo genocídio e pelo holocausto.

Graça boa mesmo é fazer piada com quem domina, com quem está no poder. O problema é que é muito difícil fazer graça de si próprio.


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